quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Dois perdidos numa lama imunda

Texto parcialmente inspirado em conversas realizadas no último final de semana. Em especial um churrasco na casa de um certo molusco. Agüenta o tranco?

Sabe aquela sensação de acordar no meio da noite e não conseguir se mexer? Assim, você parado na cama, acha que está de olhos abertos quando não está? Na hora de mover um músculo sequer... nada, não consegue. Você concentra todas as forças no dedinho do pé, na esperança de mudar alguma coisa. Pra completar, rápido subindo por sua espinha uma forte onda de formigamento. Desespero vira pavor. Você não está sonhando. É um pesadelo... Dois segundos depois você sai do transe. A mistura no peito é alívio com um pouco de vergonha pelo ridículo da situação... Tirando o humor ácido, essa é a sensação que fica ao ler Medo e Delírio em Las Vegas, uma jornada selvagem ao coração do Sonho Americano (Editora Conrad), obra-prima do polêmico escritor americano Hunter S. Thompson.

Quando Thompson viajou com seu advogado para o deserto de Nevada (em 1971), os anos 60 eram um passado distante. Os Beatles tinham acabado. Jimi e Janis estavam mortos (Jim indo pro mesmo caminho). Os tranqüilizantes chegavam com tudo. O sonho hippie estava acordando... leia um trecho da página 74, comentado pelo Mol no churras, pra entender melhor: “...E agora, menos de cinco anos mais tarde, basta subir um morro íngreme em Las Vegas e olhar para o Oeste com a predisposição adequada para quase enxergar a marca da maré – o lugar onde aquela onda enfim quebrou e se retraiu...”

É justamente na descrição dessa desilusão que Thompson concentra sua narrativa. Na virada da década o escritor acabou indo parar na recém-criada Rolling Stone. Aos poucos foi aprimorando seu estilo e consolidando seu nome no jornalismo americano. Mas pára, não estou falando de um nome tão limpo. Mesmo assim a tradicional revista Sports Illustrated liga passando uma pauta bizarra: cobrir a Mint 400 (ensandecida corrida de motos pelo deserto).

Ele e seu "consultor para assuntos especiais” logo tratam de alugar um carro (O Grande Tubarão Vermelho) e lotar o porta-malas de drogas - das mais variadas, possíveis e imagináveis. Essa era a deixa para um plano maior: fazer "A" reportagem gonzo DEFINITIVA. O tema? Um tratado sobre o sistema nervoso de uma América desossada - ou algo nesse sentido. Qual o melhor lugar (se não Las Vegas) para montar um quebra-cabeça de abusos, absurdos, delírios e demências? Ao mesmo tempo, tráfico de drogas é prisão perpétua em Nevada. E a quantidade carregada pela dupla é digna de sentenças repetitivas. Vai vendo...

Clássico da liberdade e libertinagem, Medo e Delírio é diversão e reflexão nas doses certas. O enquadro que ele toma sozinho na estrada é tenso e hilariante. A cena da invasão da pista de pouso do aeroporto idem. Sua descrição sobre a imprensa americana perturbadora, ainda sensata... Tem horas para se perguntar o tamanho da sorte dele, tipo quando embarca de volta para Los Angeles com os restos da festa na bagagem de mão (incluindo aí uma arma 357).

A edição da Conrad é acompanhada pelas insanas ilustrações de Ralph Steadman... Antes que alguém possa perguntar, não estou ganhando nada pra falar bem da Conrad.
“Que Deus tenha piedade de todos vocês, seus porcos”.
Feliz Ano Novo. A gente se fala em 2008.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Vá de retrô!

2007 praticamente acabou. Na tradição das listinhas de final de ano de blogs e jornais segue a minha, sem ordem aparente, dos 10 Melhores Discos gringos lançados no ano. Esqueça o hype do Arctic Monkeys e as bebedeiras de Amy Winehouse. Chega junto:

Bad Brains, Build A Nation (A improvável mistura de reggae e hardcore continua funcionando depois de tanto tempo. Pitadas de metal, psicodelia e dub fazem o tempero ideal).

Queens Of The Stone Age, Era Vulgaris (O circo vai passar e não vai deixar ninguém vivo pra contar a história. Rock puro e sem frescura: cru por dentro e cozido por fora).

Stephen Marley, Mind Control (O filho mais talentoso de Bob estréia em disco solo depois de anos como produtor. O trabalho é promissor: reggae moderno com a voz do pai).

Nine Inch Nails, Year Zero (Cada ano que passa ele fica mais sinistro, pesado e agressivo. A história de um futuro apocalíptico pelos olhos de um maníaco-depressivo).

The Heliocentrics, Out There (Que som é esse? Ainda tô tentando entender. The true is out there, some here in the space...).

The Budus Band, The Budus Band (Meio caribe, meio africano. Afrolantinfunkyjazzystyle. Tá bom ou quer mais?).

The Beastie Boys, The Mix-Up (Trilha sonora ideal para qualquer hora do dia em qualquer lugar do mundo. De manhã, tarde e noite. Na rua, na chuva ou na fazenda).

Kanye West, Graduation (O primeiro trabalho dele continua sendo o melhor. Esse último, porém, tem produção afinada. É pop sem ser idiota. Oito indicações ao Grammy).

M.I.A, Kala (A pseudo-funkeira lança seu segundo disco cheio de influências indianas, orientais e jamaicanas. Retalho preciso desses tempos de MP3).

The Chemical Brothers, We are the night (Os donos da noite quebram tudo nesse disco psico/retrô/futurista. Ao vivo então, melhor nem comentar).

Menção honrosa para a simplicidade de Ben Harper no disco Lifeline.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

It was forty years ago today...

Pegando carona nas comemorações dos 40 anos de lançamento de um dos maiores discos da música, a Editora Conrad publica Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, um ano na vida dos Beatles e amigos. Escrito pelo inglês Clinton Heylin, o livro conta histórias das gravações e contextualiza o mais famoso e polêmico álbum dos FabFour.

Lançado durante o “verão do amor”, em 1º de Junho de 1967, o Sargento Pimenta e o Clube dos Corações Solitários redefiniu não só o papel dos Beatles na época, como também o papel da indústria fonográfica e a maneira como são produzidos e consumidos os álbuns de Rock. Até hoje é cultuado por muitos como “o álbum definitivo de todos os tempos”. Ao mesmo tempo é odiado por outros tantos por conter “tudo de ruim daquela época de exageros”.

Iconoclasta, o autor não poupa nada nem ninguém. Mostra um Lennon depressivo, distante e passivo. Um Harrison indiferente e com pouca afinidade com os colegas. O Ringo, como era de se esperar, não fede nem cheira. McCartney é o único que se salva. Aparece inspirado e de bem com a vida durante as gravações. Foi ele quem soube segurar a onda dos outros integrantes e compôs o disco praticamente sozinho. Não fosse por Macca provavelmente a banda teria implodido bem antes.

Com erudição acadêmica e pesquisa contextual digna de um historiador, Heylin pode ser considerado um dos melhores críticos/biógrafos musicais da atualidade. O autor – amparado por fotos, matérias de jornais, entrevistas, discos e compactos –sintetiza toda uma cena musical, artística, cultural, política e social. Para isso cita outras bandas inglesas da época, como: Rolling Stones, Pink Floyd (ainda com Syd Barret), The Who, Jimi Hendrix Experience (dois terços inglesa), The Move, The Kinks, etc. Ah, o outro lado do Atlântico também é retratado, embora um pouco superficialmente. Da Terra do Tio Sam aparecem o “mui amigo” Bob Dylan e o frito/paranóico Brian Wilson... No final o autor ainda faz uma seleção de discos e compactos para servir de trilha sonora para cada capítulo.

Durante a leitura voltei ao disco e fiquei dividido. Musicalmente não é a melhor das obras dos garotos de Liverpool. Hoje, muitos fãs fazem mais reverência a Revolver, Abbey Road, White Álbum (né hombre?) e Rubber Soul do que ao Sargento. Mas é claro que Pepper possui seus clássicos: a faixa-título, Lucy in the Sky, Getting Better, A Day in the Life. Por outro lado tem grandes bobagens, como Fixing A Hole e a tediosa Within You Without You. Mesmo assim o grande mérito do disco é possuir uma aura inerente de ser uma espécie de síntese da época de ouro da psicodelia inglesa (e mundial)... No final de 67 ainda seriam lançados Piper at the Gates of Dawn e Axis: Bold as Love. Mas a história da música também se encarregou de coloca-los em um lugar de destaque. Ainda bem! Pimenta nos olhos dos outros é refresco.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Enigmas Geométricos

Idealizada pelos integrantes da Hurtmold, a gravadora independente Submarine Records acaba de colocar na praça dois enigmas pra fazer muito dono de gravadora ficar com dor de cabeça. Confira:

Situada na linha de frente da vanguarda musical brasileira, a banda paulista Hurtmold lança seu quarto disco em 9 anos de carreira. Sucessor do inspirado Mestro, o auto-intitulado Hurtmold representa uma virada na trajetória na banda. O disco (primeiro da carreira totalmente instrumental) começa soturno e preguiçoso, com uma percussão seca e levada de acordes maliciosos. Ao longo da faixa (e do álbum) os músicos seguem tecendo uma extensa gama de referências inusitadas: do regional brasileiro ao oriental universal, do rock ao jazz. Ambientes distorcidos, sons experimentais, instrumentos variados, melodias precisas, quebras de ritmo, mudanças de andamento... Nada difícil de escutar. Tudo coeso, lúdico até. Quem pensa que gêneros como free jazz, post-rock ou math rock são muito cabeça, inacessíveis ou mesmo quadrados pode surpreender-se. Halijascar, a última faixa, parece pequena com seus nove minutos (é sério!). Livre de rótulos jornalísticos, o Hurtmold (disco e banda) provam que a boa música é feita com paixão, transpiração e camaradagem.

Em outra praia está o trio de Chicago The Eternals. Juntas as bandas lançaram um cd split em 2003. Apesar da origem comum no post-rock ambas nunca nadaram em águas tão distintas. The Eternals também dá um “três meia” na carreira e lança um álbum ...dub. Na verdade não tem só dub, mas basicamente. Baixo e batera no primeiro plano. Melódica em algumas músicas. Sintetizadores e efeitos eletrônicos na gravação/mixagem. Ou seja, a cartilha básica do bom dub. Heavy Internacional é um disco internacional. Entenda, não estou falando de world music. Nesse mundinho quadriculado, interligado e digitalizado em que vivemos hoje, “...heavy international, the situation”. Pode parecer um conceito estranho, mas não é. As músicas falam das dificuldades e alegrias de viver nas grandes cidades. E hoje mais da metade da população mundial vive em metrópoles. Sacou? Internacional(mente) pesado! The mix is so bizarre abre o disco com força, numa mistura de metais com batida ragga/rock/hip-hop. Astra 3B aprofunda-se no clima esfumaçado com muitos efeitos. Remove Ya tem um tecladinho em loop totalmente hipnotizante e refrão com grunhido de leão. M.O.A.B., a derradeira do disco, é perfeita pro relax e fecha o esquema com chave de ouro. Soma-se a tudo isso o vocal leve e monocromático de Damon Locks (e suas letras politizadas/geométricas). Ecos do passado ainda podem ser ouvidos em algumas faixas, contudo, o trio usa sua formação musical em post-rock a serviço de um mestrado do dub. Será que o resultado pode ser chamado de post-dub? Bom, quem sou eu pra falar isso? Longe de mim. Mas tem horas que parece o Mad Professor ao quadrado. Ou seja, louco pra porra (como a sociedade hoje). Ainda assim alegre e esperançoso.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Quadrinização (o mundo all quadrado)

Atenção: Voltado para aquelas pessoas que teimam em acreditar que a terra é quadrada... e que a pior invenção do homem foi a roda.

Olá amigos,
Antes de tudo quero avisar-lhes que aqui o papo é mais do que reto. O papo aqui é QUADRADO!

Quarenta e quatro horas atrás, dentro do meu quarto, observando um quadro na parede, tive a vontade de falar sobre minhas particulares visões quadriculadas. Quadro a quadro, a função desse blog será difundir pelos quatro cantos o pensamento Quadrado. Os textos enquadrados nesse espaço discutirão assuntos diversos, como o quark, ou quem sabe o quadril... Passando por quase qualquer coisa de qualidade que tenha quatro lados iguais.

Ao contrário do que o nome possa sugerir, essa filosofia não é nada careta. É uma ideologia reveladora e transcendental, com quase 4 mil anos de história. Foi escrita dentro de uma caverna quadrada, por pedras preciosas parecidas com carimbos. Não é seita, grupo ou religião. É coisa pura, viva e limpa.

Algumas vertentes mais radicais acreditam ainda na salvação desse plano através da psyquadradelia (uma série de mudanças na nossa percepção). Mas isso é assunto para mais tarde...Fico aqui, rezando por sua quadrinização.

Vida longa ao Deus quadrado! Quadrilátero superior!

ps: Qualquer dia conto a história da briga do Quadrado com o Triangulo e o Círculo.
ps2: não confundir com a música techno pesada (também conhecida como quadradeira).

A primeira reta...

...em direção ao quadrado.